“...a perfeição dos crentes
consiste no amor; não que Deus requeira somente amor, mas que ele é uma
evidência do temor de Deus e da obediência a toda a lei”. – João Calvino, Comentário a Carta aos Efésios.
Antes da
busca por prosperidade se tornar a procura suprema, a perfeição era o alvo que
fazia o olhar cristão vislumbrar as alturas de Deus. Se perguntasse ao crente o
que ele almejava em sua luta contra o mal, certamente responderia: “Sê
perfeito, porque Deus é perfeito!”.
Os
tempos mudaram e os anseios também. Percebe-se que existe uma suspeita em
relação a possibilidade de alcançar a perfeição. Se alguém ainda busca tal
empreendimento, é considerado como pretensioso. Já ouvi pessoas dizendo: “Fulano
só quer ser perfeito!” Percebeu como uma palavra plenamente valorosa no
contexto bíblico e na história da fé dos homens e mulheres da Igreja cristã se
tornou um tanto pejorativa?
João
Calvino trabalha a questão da perfeição com naturalidade. Para ele, é algo não
apenas pertinente ao crente, mas pertencente a ele. É um vir-a-ser forjado pela
esperança de vencer o pecado e o mal, e receber a glorificação do Pai.
Estamos
a caminho da perfeição através das virtudes da perfeição. Se temos que falar e
viver a perfeição hoje, temos que atentar para o que João Calvino considera.
Ele afirma que a perfeição dos crentes está no amor. Isso podemos considerar
como sendo o ponto de partida e a essência da perfeição. Atentemos para a
consideração que o próprio Senhor Jesus deu ao amor. Ele o colocou na síntese
de toda a lei em duas proposições: amar a Deus sobre todas as coisas e ao
próximo como a si mesmo.
Para
entender a afirmação de João Calvino, temos que também atentar para o que o
apóstolo João escreveu em sua primeira carta: que Deus é amor (1Jo. 4.8).
Assim, o amor não é apenas um sentimento ou uma virtude desenvolvida pelo ser
humano como obra meritória. O amor é uma resposta que damos a Deus como amor
que nos ama.
Perceba
que se considerarmos apenas como virtude, é certo, e Calvino nos alerta disso,
que Deus não nos pede apenas a prática do amor como expressão da perfeição. O
amor como resposta de fé obediente a Deus sintetiza virtudes inerentes e
fundamentadoras do próprio amor: o temor a Deus e a obediência à sua lei. Vamos
dizer que o amor é a ponta do iceberg: no fundo do coração, alimentando toda a
disposição do mesmo, estar o reconhecimento do senhorio do Senhor (temei e
tremei diante dele) e que sua vontade seja feita na terra como é realizada no
céu.
Se vamos
usar analogias, para que se aproxime mais da terminologia calviniana – “evidência”,
é possível dizer que onde há fumaça, existe fogo: onde está o amor a Deus, que
se manifesta em verdadeiro culto e no amor aos irmãos, é porque o sacro temor e
a santa obediência estão dando seus frutos. Mostre-me seu temor e obediência
sem amor, e eu lhe mostrarei o amor que é fruto do temor a Deus e de obediência
à sua Palavra. É impossível haver verdadeiro amor sem temor a Deus e obediência
a Palavra! O amor é fruto, é evidência de algo mais plenificador. Vemos o
fruto, mas nem sempre as raízes!
Dadas
essas reflexões, é possível considerar que o desamor é consequência da falta de
temor e obediência a Palavra. Quem teme a Deus e obedece a Palavra, ama com
naturalidade e se encontra vinculado à perfeição. João Calvino segue Paulo na
afirmação paulina de que o “amor é o vínculo da perfeição” (Cl. 3.14).
Ainda
não somos perfeitos! Estamos ligados à perfeição através do amor que é
evidência de que o nosso coração é submisso ao temor e à obediência. Eis a
verdade e condição do amor, da perfeição e do culto a Deus!
Rev. Lucas Guimarães
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